Atualizações em Neurologia Cognitiva – Mai/12

Publicado: 05/06/2012 em Neurologia Cognitiva
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Novos critérios diagnósticos para doença de Alzheimer e comprometimento cognitivo leve para o neurologista na prática

(“New diagnostic criteria for Alzheimer’s disease and mild cognitive impairment for the practical neurologist”)

Budson AE, Solomon PR

Pract Neurol. 2012 Apr;12(2):88-96

Abstract: Quatro artigos na revista Alzheimer’s and Dementia em 2011 descreveram os novos critérios para demência na doença de Alzheimer (DA) e comprometimento cognitivo leve (CCL) causado pelo processo patofisiológico da DA (CCL por DA), assim como seus embasamentos racionais. Os novos critérios também incluem os critérios de DA pré-clínica, mas estes apenas para propósito de pesquisa. Os novos critérios enfatizam que o processo patofisiológico inicia anos, e talvez décadas, antes dos sintomas clínicos, e que os biomarcadores podem detectar a deposição de B-amiloide e seus efeitos neurodegenerativos no encéfalo. Os critérios são recomendações baseada em encontros [de especialistas] e necessitarão de futura validação. Mesmo assim, os autores acreditam que eles são úteis na prática clínica no momento, fornecendo guidelines mais acurados e específicos para o diagnóstico de demência por DA e CCL por DA. Assim que novos métodos diagnósticos e tratamentos para DA se tornem disponíveis, o diagnóstico por estes critérios permitirá que pacientes com demência por DA, CCL por DA e eventualmente DA pré-clínico recebam o melhor manejo possível.

Comentário: Os critérios novos para DA e CCL já foram bem explorados aqui em artigos prévios, porém é sempre bom voltar a apertar a mesma tecla, já que se trata de uma tecla essencial. Este artigo de revisão tenta sistematizar de maneira bem didática (a revista Practical Neurology é conhecida por essa característica) como classificar os pacientes com queixa de perda de memória, de acordo com os novos critérios para DA. Reforça a necessidade de reconhecermos de modo precoce o CCL e tentarmos estabelecer se o CCL é por DA ou outra etiologia (demência vascular, demência frontotemporal etc). Além disso, mostra os biomarcadores de DA (imagem, LCR e PET) como adjuvantes para aumento da especificidade do diagnóstico da doença, mas comenta que só devem ser usados se houver dúvida no diagnóstico de DA (com exceção da imagem – TC ou RM – que deve ser feita em todos os casos de demência).

Link: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22450454

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Afasia primária progressiva: um conto de duas síndromes e o resto

(“Primary progressive aphasia: A tale of two syndromes and the rest”)

Sajjadi SA, Patterson K, Arnold RJ, Watson PC, Nestor PJ

Neurology. 2012 May 22;78(21):1670-7

Abstract: Objetivo: A afasia primária progressiva (APP) tem sido proposta como englobando 3 subtipos clínicos diferentes: semântico, agramático/não-fluente e logopênico. Recentes recomendações de consenso sugerem um esquema diagnóstico baseado principalmente em achados clínicos e neuropsicológicos para classificar estas variantes. Nosso objetivo foi avaliar o quanto os pacientes com APP se adequam ao proposto sistema tripartite e se os padrões de elementos linguísticos reunidos sugerem síndromes clínicas distintas. Métodos: Um total de 46 pacientes com APP foi prospectivamente recrutado pelo Cambridge Longitudinal Study of PPA. Comparando-se as performances de pacientes contra as de voluntários sadios com 30 anos e com escolaridade pareada, o escore z foi calculado, e valores com 1,5DP fora da média dos controles foram considerado anormais. Os escores brutos dos testes foram usados com intenção de fazer uma análise de fator principal para se identificar um padrão reunido de medidas individuais. Resultados: Dos 46 pacientes, 28,3%, 26,1% e 4,3% foram classificados como categorias semântica, não-fluente/agramática e logopênica respectivamente, e 41,3% dos casos não preencheram as recomendações diagnósticas para qualquer uma das 3 variantes propostas. Não houve diferença significativa entre os grupos em idade, educação ou duração da doença. Além disso, o desfecho do fator de análise esteve de acordo com as distintas síndromes semântica e não-fluente/agramática, mas não identificou a variante logopênica. Conclusão: Analisados em conjunto, os resultados deste estudo prospectivo sugere que, mesmo havendo uma proporção substancial de pacientes com APP que não têm a variante semântica nem a não-fluente, eles não se adequam necessariamente à variante logopênica.

Comentário: A afasia primária progressiva é uma forma específica de demência frontotemporal que, diferente dos floridos sintomas comportamentais da variante comportamental, distingue-se por afetar de modo quase seletivo o domínio da linguagem, com deterioração progressiva da mesma. Depois, foi visto que esta rara doença teria 3 subtipos: uma forma de comprometimento primordialmente de semântica (demência semântica), uma com grave comprometimento da fluência e aspectos gramaticais da linguagem (forma não-fluente ou agramática) e outra com dificuldade de evocação e repetição de palavras ou frases (forma logopênica). Conduzido por um centro de excelência em Neurologia Cognitiva, este estudo põe em cheque a existência da forma logopênica – presume-se que os casos de APP sejam ou de alguma das 2 ouras formas, ou uma forma mista entre elas. Vale a pena ver os próximos capítulos desta discussão.

Link: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22573633

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Contribuições do Estudo de Framingham para Pesquisa Epidemiológica em AVC e Demências por 60 Anos

(“Contributions of the Framingham Heart Study to Stroke and Dementia Epidemiologic Research at 60 Years”)

Wolf PA

Arch Neurol. 2012;69(5):567-571

Abstract: O estudo de Framingham, o estduo epidemiológico prospectivo mais longo em atividade da história, foi iniciado em 1948 em resposta às crescentes taxas de doença cardíaca coronariana e hipertensão. Durante as décadas seguintes, o estudo de outras doenças, principalmente AVC e demência, foi adicionado. Em 1971, 5124 indivíduos descendentes da coorte original de 5209 homens e mulheres foram adicionados, e uma terceira geração de 4095 homens e mulheres foi adicionada em 2002. A estrutura em 3 gerações foi usada para descrever alguns fatores de risco mensurados na idade adulta e idosa e o posterior surgimento de AVC, demência e declínio cognitivo. Facilitou-se também os estudos de ocorrência familiar de doenças através das gerações, particularmente para pesquisa genômica. Pesquisa em demência e doença de Alzheimer (DA) gerou a determinação de fatores de risco, pelo menos para DA moderada a grave na primeira geração, para comprometimento cognitivo leve (CCL) e DA leve na segunda geração, e na terceira geração para detecção de estado pré-CCL e indicadores de declínio cognitivo na meia-vida. Estes esforços de pesquisa têm sido facilitados por estudos amplos de associação de genoma, biomarcadores, e múltiplas medidas de doença vascular subclínica. O intervalo de declínio [cognitivo] tem sido documentado com várias medidas estruturais tipo ressonância magnética e de performance cognitiva por avaliação neuropsicológica. Correlação clínica com exame neuropatológico de mais de 150 encéfalos proporcionou a confirmação entre doença cerebrovascular e índices de tecido encefálico. A identificação de pessoas com maior risco de AVC, CCL, DA e declínio cognitivo anos antes da doença pode facilitar neste intervalo de tempo entre a prevenção e o início da doença.

Comentário: Todos os médicos formados da minha geração e da anterior sabem da grande importância e impacto que o estudo de coorte de Framingham teve para a Medicina em geral, com ênfase para doenças cardiovasculares. O que pouca gente sabe é que este mesmo estudo também contribuiu bastante para o estudo das demências, principalmente da doença de Alzheimer, e de sua interação com as comorbidades cardiovasculares. Provavelmente a grande quantidade de artigos atuais que correlaciona DA com síndrome metabólica, sedentarismo, dislipidemia, hipertensão e diabetes, seja oriunda dos esforços dos pesquisadores do estudo de Framingham. Contudo, mesmo tendo dados completos de 3 gerações humanas, não surgiram novos dados sobre aspectos genéticos da DA, além da relação de predisposição dos portadores de polimorfismos da APOE.

Link: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22213410

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